Prioridades de Bolsonaro estão paradas no Congresso

De 35 projetos pactuados no início do ano após a eleição de Lira e Pacheco, apenas 8 foram pactuados

O presidente Jair Bolsonaro construiu sua base de apoio no Congresso a um custo elevado, financeira e politicamente. Além de abrir os cofres a parlamentares por meio de esquemas como o do orçamento secreto, dobrou-se ao Centrão ao qual emprestou apoio, em fevereiro, na disputa pelo controle do Legislativo. As investidas, porém, não se revertem em eficiência na análise de projetos prioritários porque, segundo congressistas, faltam foco e senso de urgência do próprio governo.

O Congresso tem, desde que Arthur Lira (Progressistas-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) foram eleitos para a Câmara e para o Senado, uma lista de 35 propostas para as quais Jair Bolsonaro pediu preferência. Na prática, o próprio governo não as encara como prioridade, ao dedicar tempo e recursos para temas laterais, de interesse político de Bolsonaro.

Do total, 27 ficaram nas gavetas ou ainda não têm votação definitiva encaminhada nas duas Casas. Dentre estes, 16 foram aprovados em um dos dois plenários. Da lista de prioridades, no fim das contas, só oito matérias foram promulgadas ou sancionadas, entre as quais algumas que vinham em estágio avançado de maturação, como a autonomia do Banco Central e a que estabeleceu regras para informatização de órgãos públicos. Também já viraram lei o texto que estimulava a criação de startups e o que reforçava a prevenção ao superendividamento de idosos, ambos sem altos índices de dissenso.

Enquanto as prioridades seguiam em "banho-maria", Bolsonaro mobilizou sua base para tentar aprovar a PEC do voto impresso. A iniciativa foi rejeitada não sem que o presidente tenha liberado R$ 1 bilhão em emendas individuais às vésperas da votação, colocado blindados nas cercanias do Congresso e dedicado "lives" à defesa da proposta. Temas centrais destacados na lista não ganharam a mesma campanha.

Pouco depois de enviar a PEC ao arquivo, Arthur Lira deu o recado: "espero que esse assunto esteja definitivamente enterrado". No dia seguinte, Bolsonaro voltou à carga lançando suspeitas sem provas contra a urna eletrônica.

Na lista de Bolsonaro, por exemplo, estava o polêmico projeto da regularização fundiária — chamado por críticos de "PL da Grilagem". De autoria do deputado ruralista Zé Silva (PSD-MG), o projeto enfrentou resistência por parte de governistas, que ameaçaram um substitutivo para tornar mais permissivo o texto original e aprofundar a flexibilização do registro de terras ocupadas por meio da autodeclaração. O texto final foi aprovado no início do mês pela Câmara e ainda depende do Senado.

"O substitutivo chegava a ser pior que a própria MP da Grilagem (criticada por ser demasiadamente permissiva)", afirmou Zé Silva, crítico da falta de foco da base. "Essa coisa de discutir voto auditável, voto impresso… Temos de tratar dos temas fundamentais, reforma tributária, estruturação do Estado brasileiro. Às vezes, perdemos tempo com coisas menos importantes."

Até entre aliados, a escolha das prioridades é vista com ressalvas. O senador Marcos do Val (Podemos-ES) é relator na Comissão Constituição e Justiça do projeto que regulamenta porte e posse de armas para Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs). Aprovado na Câmara em 2019, está parado desde o ano passado no Senado. Ele afirma que tem conversado com entidades para fugir de polêmicas e propor um texto equilibrado, mas espera que a matéria não seja votada neste ano.

"Eu torço para que não (seja votada em 2021). Temos que finalizar as prioridades enquanto estiver morrendo brasileiro com covid. Aí, depois vem reforma tributária, administrativa. Estranhei quando esse projeto veio na lista, e eu disse isso. Veio fora de hora", afirmou.

Outro projeto elencado pelo presidente foi apresentado ainda em 2019 pelo deputado Jerônimo Goergen (Progressistas-RS), para a instituição de um documento único de transporte para autorização de transportes de carga. O texto ficou à espera de parecer na Comissão de Viação e Transportes. A saída foi recorrer a um atalho.

"Estávamos vendo que tramitar nas comissões, e tudo aquilo, ia se arrastar. E achamos que ia ser mais rápido a edição de uma medida provisória", frisou Goergen. A MP foi aprovada pela Câmara e ainda precisa ser apreciada pelo Senado para ter validade.

A edição de medida provisória também foi o caminho encontrado pelo governo Bolsonaro para tentar viabilizar a venda da Eletrobras. A intenção estava em um projeto de lei do Executivo, ainda de 2019, que adormeceu na Câmara. A MP foi aprovada pelos congressistas em junho. Com a edição do texto que tem vigência imediata, o governo abrevia etapas e coloca sobre o Congresso a pressão para manter ou não a validade da medida.

A PEC da reforma administrativa também foi relacionada por Bolsonaro como prioritária. O texto é de 2020. Foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça em maio e ainda aguarda parecer em uma comissão especial. Sem consenso, não há previsão para que a proposta seja votada no colegiado ao menos neste mês, muito menos para que seja promulgada.

Na Câmara, também existe o interesse do governo de transformar em lei o projeto que muda a Lei de Gestão de Florestas Públicas e flexibiliza o modelo de licitação e os contratos para concessão dessas áreas à iniciativa privada. Hoje, a lei atual de concessões florestais é considerada muito burocrática.

Com informações do Terra